A Vida Trágica de Nim Chimpsky, o Chimpanzé Mais Humano Que Alguma Vez Existiu
A nossa relação genética com chimpanzés tem sido objecto de análise de vários estudos ao longo dos anos. Na década de 70, um grupo de psicólogos curiosos decidiu mergulhar mais fundo na exploração daquelas que são as similaridades entre o homem e o chimpanzé. A questão que procuravam esclarecer era: será um chimpanzé capaz de comunicar como nós, ou é a nossa linguagem uma habilidade exclusivamente humana?
Nim Chimpsy foi o subject desta experiência. No entanto, este chimpanzé muito especial foi deixado com nada senão um coração partido - literalmente. Continue a ler para descobrir mais acerca do chimpanzé que cresceu acreditando ser humano, bem como do seu trágico e infeliz destino.
Uma Experiência Controversa
De entre todos os animais, nós somos o único que consegue articular pensamentos abstractos através do discurso. Até mesmo os chimpanzés - que são os nossos parentes naturais mais próximos - não conseguem reproduzir o mesmo tipo de sons e sinais. Talvez tenha sido por isso que, quando investigadores tentaram incutir linguagem num chimpanzé, eles tenham escolhido a língua de sinais americana.
Um jovem e adorável chimpanzé baptizado de Nim Chimpsky foi escolhido para a experiência, que acabaria por se provar nefasta e desastrosa. Esta é a história real de Nim Chimpsky. Uma história acerca de um chimpanzé, mas que também é uma história acerca da nossa crueldade e arrogância.
Separado da Mãe à Nascença
Nim nasceu no Instituto de Estudos Primatas, sendo o sétimo filho de uma fêmea chamada Carolyn. Como todos os seus irmãos, Nim foi separado da mãe à nascença em nome da ciência, por mais que Carolyn tentasse a todo o custo evitar que tal acontecesse. Sempre que ela tentava lutar contra os cientistas, os responsáveis respondiam com uma arma tranquilizadora.
Nim foi apenas mais um dos vários filhos que Carolyn perdeu às mãos das pessoas que estavam à frente do instituto; uma situação que naturalmente desperta o desespero em qualquer mãe. Mas para Nim estava reservado um futuro especial - ele seria criado desde bebé como se fosse um ser humano.
A Origem do Nome Nim Chimpsky
Talvez como um primeiro indício daquilo que aconteceria mais tarde, o nome 'Nim Chimpsky' teve como origem uma piada. Resultava como uma bicada ao linguista americano Noam Chomsky, que defendia em inúmeros livros que a linguagem era exclusiva aos seres humanos.
Tendo em conta que os investigadores que recolheram o pequeno chimpanzé pretendiam comprovar precisamente o contrário, nós admitimos que percebemos a piada. Nim Chimpsky é uma derivação bastante cómica do nome Noam Chomsky, mas esta primeira opção por parte dos investigadores, ainda que aparentemente insignificante, revela à partida alguns laivos de falta de seriedade.
Criado Por Humanos em Nome da Ciência
A experiência começou assim que Nim Chimpsky foi relocalizado para uma casa em Nova Iorque, onde Stephanie LaFarge vivia com a sua família. Enquanto estudante de psicologia, LaFarge tinha sido aluna de Herbert Terrace, o principal responsável pelo projecto.
Stephanie pegou em Nim pela primeira vez quando ele tinha apenas 10 dias de idade, e levou-o para sua casa, onde poderia cuidar dele. Lá, ela deu de mamar ao primata da mesma forma que tinha feito com os seus sete filhos! Stephanie e o seu marido ofereceram um lar a Nim, que se acredita que tenha vivido toda a sua vida pensando ser humano, tal como toda a gente em seu redor.
Viciado em Marijuana e em Café
Embora tivesse sido criado como uma criança humana, Nim teve muitas vezes acesso a substâncias psicoativas que não são apropriadas nem para uma criança nem para um chimpanzé. Neste caso, referimo-nos a café e a marijuana. Nim claramente apreciava os seus cigarros de erva, e usava muitas vezes linguagem gestual para pedir uma chávena de café às pessoas em seu redor.
Este acesso a substâncias psicoativas podia nem ser especialmente escandaloso durante a louca década de 70, mas seria sem surpresa mais tarde apontado como uma das grandes falhas do projecto científico levado a cabo por Terrace.
O Primeiro Animal de Sempre Na Capa da New York Magazine
Nim tornou-se no primeiro animal de sempre a aparecer na capa da New York Magazine, graças às suas características únicas que lhe valeram o estrelato imediato. O caso de um chimpanzé que era capaz de comunicar com os seres humanos enchia as medidas da imprensa norte-americana, e Nim acabou por ser frequentemente convidado para aparecer em programas de televisão.
Obviamente, Nim Chimpsky era muito especial. Mas, juntamente com a sua fama, algumas questões éticas surgiram. Seria errado criar um chimpanzé como se ele fosse um ser humano? E o que aconteceria assim que ele atingisse a idade adulta? A infeliz resposta a estas questões chegaria muito em breve.
O Despertar da Besta
Assim que os chimpanzés se tornam adultos, eles têm tendência para assumir uma postura mais violenta; isto é uma parte fundamental dos seus instintos animais. Nim era agora um perigo para a sua família, e Stephanie não conseguia continuar a lidar com ele à medida que o seu comportamente se tornava mais instável e agressivo.
Esta mudança de personalidade criou a necessidade de um realojamento. Os responsáveis pelo projecto mudaram Nim para uma propriedade em Columbia, de modo a poderem prosseguir com a sua experiência. Mas esta mudança só agravaria o estado do chimpanzé, que frequentemente atacava o staff que estava ao seu cuidado, tendo inclusive mordido a cara de um dos seus educadores.
Intervenção Humana
Nim continuou o seu processo de aprendizagem enquanto viveu em Columbia. Lá, ele conheceu Laura Petitto, que acabaria por se tornar numa espécie de segunda mãe. Laura só tinha 18 anos na altura, mas era muito inteligente e determinada. Contudo, a relação entre os dois acabaria por se deteriorar...
O comportamento agressivo de Nim tornou-se cada vez mais severo com o tempo; adicionalmente, Laura envolveu-se com Terrace, numa relação que ameaçava seriamente a seriedade do projecto científico. O amor que existia entre ambos, assim como a dedicação bastante sentimental que os dois ofereciam ao chimpanzé acabaria por ameaçar conclusivamente a objectividade do projecto.
A Lei do Mais Forte
Existia outra estudante envolvida no projecto de Terrace, e o seu nome era Joyce Butler. Joyce, ao contrário de Laura, compreendia que Nim estava programado para viver segundo as leis do mundo animal, e em vez de simplesmente cuidar do chimpanzé, não tinha receio de corresponder à sua violência com... violência. Um dia, Joyce chegou mesmo a morder a orelha de Nim de modo a castigar o seu comportamento agressivo.
À medida que Chimpsky continuava a crescer e a tornar-se mais forte, o staff de Columbia colocava na mesa a hipótese de usar força para disciplinar o animal. Até hoje não se sabe até que ponto o comportamento de Nim foi castigado pelos investigadores.
Nim, Criado Como Um Humano, É Enjaulado Com os Outros Chimpanzés
Quando Nim atacou um dos intérpretes que fazia parte do projecto, Terrance decidiu injectá-lo com tranquilizantes e enviá-lo de volta para o instituto onde ele tinha nascido, no Oklahoma. Tinha sido a última gota de água para o pequeno chimpanzé.
Nim foi colocado numa jaula, onde estava rodeado de outros chimpanzés que, ao contrário dele, tinham passado grande parte da vida em cativeiro. Chimpsky podia ter sido criado como se fosse uma criança humana, mas acabou a ser tratado como um comum primata. Sem dúvida uma experiência traumatizante para o nosso chimpanzé.
Vendido ao Black Beauty Ranch
Tendo em conta o estado actual de Nim, Terrace sabia que a sua experiência se tinha revelado um falhanço. Ele enviou-o de volta para o Instituto de Estudos Primatas, onde ele foi tratado como um chimpanzé depois de cerca de 10 anos a viver entre humanos.
Durante o seu tempo no Instituto, Nim era muitas vezes utilizado em experiências. Mas a vida do chimpanzé acabaria por tomar uma nova direcção: o director do IPS decidiu vendê-lo de modo a angariar fundos, e Cleveland Armory, dono do Black Beauty Ranch, decidiu comprá-lo, por acreditar que o poderia ajudar. Ele não podia ter adivinhado o que aconteceria depois...
Os Dois Tesouros de Nim Chimpsky
No Black Beauty Ranch eram oferecidas a Nim várias revistas e livros de criança de modo a mantê-lo ocupado. Embora ele tivesse tendência para destruir algumas das revistas, ele parecia gostar de certos livros, e dois em particular eram-lhe muito queridos.
O primeiro era um livro acerca de linguagem gestual, que incluía ilustrações da Rua de Sésamo; o segundo era muito mais pessoal. Tratava-se de um livro acerca da sua história, cujas páginas mostravam fotos dele próprio, mas também de pessoas que lhe eram importantes, como Terrace e a sua primeira mãe, Stephanie LaFarge.
Terrace Visita Nim Uma Última Vez
Tal como os humanos, os chimpanzés são criaturas naturalmente sociais e Nim em particular, até porque tinha sido criado como um homem. Quando Herbert Terrace finalmentte visitou o chimpanzé no Black Beauty Ranch, Nim saltou para cima dele, abraçou-o e mostrou vários sinais de afecto. O pobre animal provavelmente pensava que ia voltar para a sua família em Nova Iorque...
Na realidade, este seria o último encontro entre Nim e Terrace. Os seus primeiros meses no rancho tinham sido duros para a saúde física, mental e emocional. Talvez ele não estivesse a ser maltratado por outros chimpanzés, como tinha acontecido no IPS, mas a verdade é que ele estava completamente sozinho.
Projecto Falhado, Chimpanzé Abandonado
Nim tinha sido abandonado pela primeira vez assim que foi separado da sua mãe de nascimento. Mais tarde, voltou a experienciar rejeição depois de deixar Stephanie, a única mãe que realmente tinha conhecido. Mas o seu último abandono, que seria responsável por quebrar o seu frágil estado emocional, aconteceu quando a pesquisa de Terrace foi interrompida.
A sua vida no rancho era extremamente solitária, e tanto Terrace como Stephanie apenas visitaram o chimpanzé uma vez. Os seres humanos envolvidos na experiência científica podiam não estar isentos de culpa na história trágica de Nim Chimpsky, mas estariam certamente muito frustrados por tudo o que tinha acontecido de errado ao longo do projecto.
Nim Atacou a Sua Mãe Adoptiva
Quando Stephanie foi visitar Nim, pareceu, durante um momento, que uma amorosa reunião se preparava para ocorrer. Esta ideia desapareceria num instante, já que Chimpsky explodiu num ataque de raiva e tentou a todo o custo evitar que Stephanie deixasse a sua jaula: ela tinha entrado sem protecção, e tinha deixado o infeliz reencontro com várias lesões graves.
Stephanie diria mais tarde que sentia que o ataque tinha sido justo; afinal de contas, ela tinha basicamente abandonado um dos seus filhos. Embora muitos concordassem com ela, a verdade é que este pareceu ser um ponto final na estima que muita gente envolvida no projecto de Terrace ainda poderia manter pelo nosso pobre chimpanzé.
Tal Como Um Humano, Nim Enlouqueceu Com o Isolamento
É sabido que o isolamento é uma das piores torturas possíveis para um ser humano. O mesmo se aplica aos chimpanzés. O comportamento de Nim tornava-se cada vez mais incontrolável à medida que ele era exposto a cada vez maiores períodos de isolação. Encurralado entre dois mundo, o nosso chimpanzé - metade primata, metade humano - nunca conseguiu socializar com outros da sua espécie.
De modo a manter-se ocupado, Nim tentou jogar alguns jogos, mas a ocupação revelou-se insuficiente para conter a sua inevitável loucura. A sua saúde mental estava a deteriorar-se com rapidez no momento em que uma nova esperança surgiu, ainda que por um breve instante apenas.
Sally, Uma Última Esperança
Nim sentia-se cada vez mais deprimido e isso notava-se. Um dos seus amigos mais próximos do tempo do IPS, de seu nome Bob Ingersoll, apercebeu-se de que o chimpanzé se encontrava extremamente infeliz após uma visita. Foi nesse momento que ele teve uma ideia que, durante um bocado, injectou alguma esperança na situação.
Sally era um chimpanzé fêmea que tinha estado num circo e que sabia um monte de truques que impressionavam Nim. Quando se conheceram, eles pareciam estar muito felizes; mas a situação rapidamente mudaria de figura. Quando Sally morreu, vítima de ataque cardíaco, Chimpsky voltou a sentir-se sozinho e isolado e a sua depressão rapidamente regressou, mais forte do que nunca.
Antes do Fim... A Aceitação!
Depois da morte de Sally, os donos do Black Beauty Ranch decidiram expandir a área de modo a acomodar mais chimpanzés. Vindos de outras instituições, novos amigos como Lulu, Midge e Kitty acabariam com o isolamento de Nim, que durante o período final da sua vida parece ter encontrado paz e amor junto da sua espécie.
Depois de ter passado toda a vida encurralado entre o mundo dos chimpanzés e o mundo dos humanos, Nim finalmente vivia de acordo com a sua natureza de primata, no seio de uma pequena família de outros que, por serem como ele, tinham o poder de o aceitar e incluir completamente.
Nim Deixou-nos Aos 26 Anos
Nim Chimpsky, o mais humano de todos os chimpanzés, morreu aos 26 anos de idade após uma vida de abandono e negligência. Isto não é comum para um chimpanzé, que normalmente vive entre 60 a 70 anos. O seu fim foi por isso trágico e precoce.
A morte de Sally foi a última gota: o coração de Nim tinha sido partido demasiadas vezes. Apesar de ter morrido muito jovem, Nim deixou um legado muito importante, e acima de tudo uma lição a todos os seres humanos: a de que devemos respeitar toda a vida com cuidado e responsabilidade, e nunca usar o sofrimento de outras espécies em nosso favor.
Uma Vida Repleta de Amor
A morte de Nim pesou muito sobre as várias pessoas que o tinham acompanhado ao longo da sua curta vida. Apesar de todas as desventuras, Chimpsky tinha muitos amigos: a começar por Stephanie, a sua mãe adoptiva, que o acompanhou durante todos os seus anos de formação.
Mas existiam outros. Bill Tyman, que cuidou pessoalmente dele, Laura Pettito, que ele ajudava a cozinhar e com quem ele brincou muito, o seu melhor amigo Bob Ingersoll, que o apoiou nos momentos mais difíceis e, claro, Herbert Terrace, o homem por detrás de toda a experiência.
Um Erro Desde o Início?
Quando o projecto se encontrava numa fase inicial, Terrace era o primeiro a mostrar-se entusiasmado com os resultados obtidos. No entanto, quando a experiência foi interrompida, tudo mudou. No relatório final submetido por Terrace, a experiência foi considerada um falhanço. De acordo com o cientista, Chimpsky nunca tinha usado a linguagem como mais do que mera imitação, que ele explorava de modo a obter recompensas por parte dos humanos em seu redor.
Muitas pessoas discordaram deste diagnóstico, mas a verdade é que Terrace foi conclusivo em relação ao seu veredicto, chegando mesmo a dizer que remover Nim do seu habitat natural e expô-lo a uma vida de sofrimento tinha sido errado.
Um Projecto Demasiado Ambicioso
O projecto de Terrace era muito ambicioso. Caso a experiência com Nim tivesse sido bem sucedida, ele pretendia ensinar linguagem gestual a um chimpanzé fêmea para mais tarde explorar as dinâmicas que Chimpsky e a sua hipotética parceira podiam introduzir na educação das suas eventuais crias.
No fim, todo o trabalho resultou num falhanço gigante. Terrace foi o primeiro a reconhecer isto, e quando publicou as suas conclusões foi muito criticado. Nem todos concordaram com o seu veredicto, mas a verdade é que a experiência de Nim não fez nada senão atrasar o progresso científico no campo do estudo científico da linguagem.
Terrace Quase Aniquilou o Estudo da Linguagem de Primatas
As afirmações de Terrace em relação ao projecto foram mais longe do que muitos pensam. Terrace não foi duro apenas com a sua experiência, mas chegou ao ponto de declarar que todos os estudos do género eram irracionais e condenáveis.
Estas conclusões tiveram um impacto bastante negativo nas pesquisas de muitos outros investigadores científicos que exploravam a questão da linguagem com recurso a subjects animais. Pouco a pouco, o estudo científico neste campo tem voltado a receber apoiantes; afinal, existem demasiadas falhas na experiência de Terrace para que esta se possa provar conclusiva.
Project Nim, o Documentário
Project Nim é um documentário realizado por James Marsh. Ele conseguiu reunir um monte de gravações inéditas da experiência, além de entrevistar os principais envolvidos. Estes incluem o director da experiência, Herbert Terrace, mas também Jenny Lee, a "irmã" de Nim Chimpsky que o acompanhou durante os seus anos de formação.
O amigo Bob Ingersoll também participou, e deixou bem claro que o período que Nim passou em isolamento pode ser comparado a tortura. O documentário foi aclamado pela crítica e conseguiu uma série de prémios e nomeações que incluem um Prémio BAFTA.